Uma vez uma grande empresa me pediu para assessorá-la a implantar um relatório seguindo as diretrizes do GRI (Global Reporting Initiative). Quando eu disse quais eram as informações que deveriam compor o relatório, o executivo responsável me disse que não tinha nenhuma daquelas informações, e me perguntou como a empresa poderia publicar o relatório. Minha resposta foi bastante simples: não pode!
Hoje vejo uma série de “especialistas” falando sobre o “greenwashing”. Que as empresas querem adotar as práticas ESG mas no fundo não adotam práticas ambientais e sociais. E a pergunta que eu faço é por que? Qual a causa?
Não se começa uma casa pelo telhado!
Alguns empreendedores insistem em começar o processo ESG pelo final. É como construir uma casa pelo telhado. Se o alicerce não for forte, uma hora a casa cai. Se é que alguém irá conseguir erguê-la!
Os critérios ESG são um conjunto de padrões das operações de uma empresa que os investidores usam para selecionar investimentos responsáveis. E, de acordo com o Principles for Responsible Investments, investimento responsável é:
“uma abordagem de investimento que procura incorporar os fatores ambientais, sociais e de governança nas decisões de investimento, de forma a gerir melhor os riscos da empresa e a gerar retornos sustentáveis de longo-prazo”.
Ou seja, é preciso ter Responsabilidade Social Corporativa, Gestão Ambiental e Gerar produtos que tenham Valor para a sociedade. Cada um destes três elementos, que compõem a sustentabilidade corporativa, é composto por uma série de elementos que passam por um processo de amadurecimento:
Integram a Responsabilidade Social uma gestão mais social; a gestão dos stakeholders e a análise ambiental.
A gestão social é um jeito de ser da empresa. Está integrada à cultura organizacional e envolve uma preocupação com a sociedade que extrapola as exigências legais;
A gestão dos stakeholders está ligada à forma como a empresa lida com a sociedade, funcionários, clientes, fornecedores, entre outros, e;
A análise ambiental refere-se a forma como a empresa se relaciona com o meio ambiente. Suas preocupações com o meio ambiente, e como a empresa passa isso para seus stakeholders.
A responsabilidade social está mais ligada ao “S” do ESG. Ou seja, está mais relacionada ao social, e por isso é mais intangível, mais difícil de ser quantificada. Mas cuidado! Ela é muito fácil de ser observada, pois está mais próxima ao dia a dia dos stakeholders.
A análise ambiental, não é gestão ambiental.
A gestão ambiental está relacionada às operações da empresa. E acontece em três estágios (que alguns chamam de níveis de maturidade da empresa).
No primeiro estágio tem-se o “end of pipe” ou “compliance”, que equivale a recuperar/restaurar os estragos feitos. Se o meu processo gera gases ruins, eu coloco um filtro, e pronto! O problema está resolvido. Isso é bom? É melhor do que não fazer nada, mas está longe do ideal.
No segundo estágio tem-se uma preocupação com o processo produtivo. Vou produzir bem para não gerar impactos ambientais. É realizada uma revisão dos processos produtivos, das cadeias de fornecimento, da logística etc. Aqui entram os processos de produção mais limpa.
No terceiro estágio, conhecido como “cradle for cradle”, é analisado todo o ciclo de vida do produto, que vai desde a sua concepção até o descarte final. É aqui que se encaixa a economia circular. Pode-se dizer que este estágio é o mais maduro e o mais estratégico.
Finalmente, gerar valor corresponde a produção de bens e serviços que gerem valor para a empresa e para a sociedade, redução de custos e aumento de produtividade.
Gerar valor para a empresa está relacionado a produção de bens e serviços que tragam benefícios para a sociedade (externalidades positivas), sem degradar o meio ambiente e a sociedade (externalidades negativas), enquanto gera riqueza para os stakeholders de modo geral. Não se assuste, não tem problema nenhum a empresa ganhar dinheiro. Uma empresa economicamente saudável produz produtos de alto valor agregado, gera empregos, paga impostos que reverterão para a sociedade (assim espero!).
A redução de custos contempla uma revisão de processos produtivos. Ao fazer isso, a empresa pode substituir determinadas matérias primas não renováveis, passar a utilizar energia limpa, captar água da chuva. Em outras palavras, ao analisar formas para reduzir custos a empresa perceberá que a adoção de práticas mais amigáveis ao meio ambiente pode ser uma aliada. Desta forma, a empresa reduzirá custos e ainda gerará produtos de maior valor para a sociedade.
Aumento de produtividade ao estabelecer uma relação melhor com seus stakeholders, notadamente os funcionários, estes se sentirão mais motivados e produtivos. Haverá uma redução na rotatividade, e uma melhoria na qualidade dos produtos. O engajamento será maior.
Note que estes três elementos estão intrinsecamente relacionados.
Uma empresa madura em ESG ou maturidade ESG
Uma empresa madura ESG, ou com maturidade ESG, é uma empresa que passou por essas etapas, identificou seus riscos, promoveu melhorias em seus produtos, serviços e em sua forma de gerenciar o seu negócio.
É uma empresa que conduz seus negócios com transparência; é ética em suas transações comerciais e na forma como lida com seus stakeholders. Ela respeita e promove a equidade em seus mais diferentes gêneros (vejam que não é apenas equidade de gênero e sim “gênero de equidade”). Em outras palavras, é uma empresa com uma governança madura, experiente.
Da mesma forma que não se começa uma casa pelo telhado, não se busca a sustentabilidade a partir do ESG. O ESG é a consequência de boas práticas.
Espero que esta análise ajude a entender porque algumas empresas fazem “greenwashing” ou adotam o ESG apenas na teoria. É porque elas não conhecem ou não vivenciaram cada uma dessas etapas.
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